Marrancos tem mais encanto na hora da Espadelada do Linho
Marrancos assume-se como um
bastião da cultura do linho na nossa região e, ontem (08 de setembro), voltou a
brindar vilaverdenses e visitantes com um autêntico hino ao mundo rural e à
cultura popular. As vestes de outrora e as alfaias agrícolas, os cânticos
tradicionais e o folclore, animação e muita alegria. No final, uma farta
merenda para fortalecer o corpo e confortar alma, como manda a boa tradição do
Minho. Para reforçar a simbologia associada ao evento, a recriação fiel da espadelada
tradicional realizou-se no exterior do Museu do Linho, que celebrou o 5º
aniversário e até teve direito a bolo de parabéns. Como é habitual, o público
não se limitou a assistir, pôde trabalhar a planta do linho com as alfaias agrícolas
e experimentar os trajes tradicionais. Uma emocionante viagem pelo tempo à
descoberta herança cultural minhota, com vários motivos de interesse que fazem
da espadelada do linho “uma das meninas dos olhos da Rota das Colheitas”. A
iniciativa resulta de uma organização conjunta entre a ARC Marrancos e a Junta
da União de Freguesias de Marrancos e Arcozelo.
O calor era abrasador, mas não
foi por isso que as pessoas ficaram em casa. Aos poucos, a parte exterior do
Museu do Linho ia ficando mais composta e começava a festa. Por volta das
15h30, mais de vinte mulheres (dos 10 aos oitenta (e tal) anos de idade)
apresentaram uma espadelada do linho à moda antiga, sem tirar nem por. O
ripeiro, o fuso, a espadela, o sedeiro, o tear…. Uma longa fila de
trabalhadoras manuseava com destreza as alfaias de outrora, demonstrando a
complexa e trabalhosa tarefa de extrair as fibras da planta do linho. O vinho
verde fresco servido em malga ia contrariando o calor intenso, refrescando as
gargantas e renovando o ímpeto das trabalhadoras. Entre as visitas guiadas ao museu
e a espadelada, os visitantes ficaram a conhecer ao pormenor o ciclo da planta
do linho. Enquanto os presentes procuravam as sombras para se refugiarem do sol
abrasante, as hostes marranquenhas não desarmavam e ainda houve tempo para os cantares
de ontem e os cantares típicos do ciclo do linho. Não faltou também a animação
contagiante do folclore com a atuação do Rancho folclórico de Marrancos. Depois
da atuação, tempo para fortalecer o corpo e o espírito com uma merenda à boa
moda do Minho. Carne de porco cozido, frango do churrasco, chouriço, pão de
milho, caldo de castanha e vinho verde da terra, foram apenas algumas das
iguarias servidas no local, além do bolo de aniversário do Museu do Linho.
A
tradição está de boa saúde e recomenda-se
Uma experiência única e um
deleite para os sentidos. Uma tradição que se vê na recriação da espadelada. Que
se sente ao manusear as alfaias e se saboreia nas deliciosas iguarias minhotas.
Que cheira à planta do linho e se faz ouvir a plenos pulmões nas vozes dos
intervenientes. “É com grande orgulho que estou aqui. É tão bonito ver a
freguesia unida, ativa e disponível para mostrar o nosso passado”, afirmava uma
das trabalhadoras. “Dos trabalhos mais bonitos que fiz até hoje”, referia outra
mais à frente. Apesar da tenra idade, a jovem Irina Fernandes (10 anos) já não
é nenhuma novata nestas andanças, “não é a primeira vez, já tinha feito
espadeladas antes”, e também estava inserida do grupo de trabalho. Trajada a
rigor, de sorriso rasgado no rosto e mãos na fiadora, confessou que não foi preciso
muito para convencê-la a participar. “Fui eu que quis vir, isto é muito
engraçado. A minha bisavó já fazia isto e agora eu quero continuar!”, vincou.
Museu
do Linho prepara-se para crescer!
Com mais experiência, mas
mantendo uma jovialidade invejável, o octogenário Abílio Ferreira já perdeu a
conta ao número de espadeladas em que participou. Natural de Marrancos, herdou
dos pais a arte de extrair as fibras do linho, matéria que em tempos era
utilizada na confeção dos mais variados têxteis (vestuário, toalhas de mesa,
roupa da cama…). Uma prática agrícola que foi esmorecendo, mas que nunca desapareceu,
até porque o marranquenho continua, hoje em dia, a dedicar-se ao cultivo.
Abílio Ferreira recuperou esta tradição nos anos oitenta do século passado e,
há cinco anos, com o apoio do Município de Vila Verde, viu o sonho tornar-se
realidade ao inaugurar o Museu do Linho. Agora, prepara-se para voos mais
altos, porque “o Museu vai ser alargado e será criado um espaço para outras
atividades agrícolas”. Sem levantar muito o véu, revela que não pretende parar
por aqui: “Já me sinto realizado, mas ainda me falta fazer umas coisas que eu
tenho em mente”. Sublinha a importância da iniciativa, “as recriações vão
alertando e reavivando a memória das pessoas”, e da programação turístico-cultural
do Município de Vila Verde, “a Rota das Colheitas deixou a tradição num ponto
ainda maior”.
A
chama da tradição continua bem acesa
Presente no local, a vereadora
da Cultura do Município de Vila Verde deixou rasgados elogios ao timoneiro. “Marrancos
e o Museu do Linho têm aparecido na televisão pelas mãos deste homem [Abílio
Ferreira] e do seu trabalho incondicional. Esta é uma iniciativa única, em que
temos uma espadelada tradicional, com estas belas mulheres e raparigas, no
exterior de um museu dedicado ao ciclo do linho”, afirmou Júlia Fernandes, congratulando
todos os envolvidos na iniciativa por um excelente trabalho de preservação e
divulgação da genuína tradição local. “É uma das grandes ações da programação. É
uma excelente iniciativa e uma das meninas dos olhos da Rota das Colheitas”,
frisou a vereadora da Cultura.
O
ciclo do linho, da sementeira ao tear
Para terminar, uma apresentação
rápida do ciclo do linho. Em primeiro lugar está a semente que se transformará na
matéria prima: a planta do linho. Depois de colhido e seco, o linho vai para o
ripeiro onde se separa o caule do resto da planta. Já ripados, os caules são
organizados em molhos e colocados no tanque a ‘demolhar’. De seguida regressam
à ‘eira’ para serem malhados violentamente (“estou a dar uma coça do linho”,
chegou a dizer uma senhora) e moídos, quebrando ainda mais a parte lenhosa, o
que facilita a extração da fibra. Chega a altura da famosa espadelada, com
várias mulheres de espadela em punho a bater o linho pousado sobre o espadouro.
A fibra está assim liberta do caule e pronta para ser fiada. Segue-se a
passagem pelo sedeiro, um pente de dentes de aço finos, que elimina os últimos
vestígios de caule. De fuso na mão, uma das mulheres fia o linho,
transformando-o no fio. Depois de fiado é dobado e lavado, antes de estar
finalmente pronto para ser tecido no tear.
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